Ícone do site Cachoeira do Sul em tempo real

Violência em tempos de pandemia: realidade no Presídio de Cachoeira

Uma combinação perigosa desafia a equipe de direção e agentes penitenciários no Presídio Estadual de Cachoeira do Sul. Os ingredientes: violência, visitas suspensas por causa da pandemia, superlotação e transferências como mecanismo para controlar a situação.

A reportagem do Portal OCorreio apurou casos de agressões dentro da casa prisional cachoeirense no período de pandemia do novo Coronavírus. Uma das ocorrências gerou processo administrativo que segue em andamento. A vítima das agressões foi um rapaz. As lesões mais graves foram na região da cabeça do detento. Outros presos providenciaram o registro em imagem das consequências da violência. “Os familiares estão em desespero na rua. E o que esperamos no mínimo seria uma resposta”, descreve um amigo localizado pelo OC. “Como isso acontece lá dentro com presos? Como essa imagem foi feita? Estão tentando tirar ele dali para não vazar isso”, dispara.

Crédito: OC/Reprodução

O chefe de segurança da instituição prisional e diretor substituto, Mário Muller, garante que os protocolos são seguidos na busca de controle. “Trabalhamos para elucidar o que acontece aqui dentro. Ocorreu uma desavença em virtude de questões externas. Não é uma situação normal”, detalha. “Foi oferecido atendimento ao preso e medidas para tentar conter o conflito. Estamos fazendo uma ‘costura’ para uma casa prisional próxima para garantir sua integridade física em outro local”, completa.

Muller explica que o atual contingente carcerário em Cachoeira do Sul gira em torno de 300 detentos. Ou seja, o triplo da capacidade, de acordo com o chefe de segurança. “Celas para seis presos tem mais de 20!”, dispara a familiar de uma pessoa detida na casa prisional que também aceitou conversar com a reportagem. “Está dentro do contexto de um panorama normal. Nas celas superlotadas, ocorrem desavenças internas que por vezes podem sair do controle”, indica Muller.

O diretor do Presídio de Cachoeira do Sul, Adriano Martins, comenta sobre a ocorrência que resultou em ferimentos no detento. “Nessa semana que passou tivemos uma briga em uma cela. O apenado foi encaminhado para atendimento e foi feito o registro de ocorrência contra os demais. Os presos vão responder a processo administrativo e será verificada a possibilidade de serem encaminhados para outros presídios”, relata Martins.

Em medida adotada no mês de março para proteger familiares, detentos e comunidade em geral, a direção do Presídio Estadual de Cachoeira do Sul suspendeu a visitação, seguindo orientação da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe) e da Secretaria de Administração Penitenciária (Seapen) sobre restrições ao acesso a presídios na tentativa de prevenir o avanço do Coronavírus no sistema prisional do Rio Grande do Sul.

Foto: OC/Reprodução

Detentas

No fim de junho, uma funcionária pública foi presa pela Brigada Militar por tortura em que a vítima foi um bebê de cinco meses, residente do abrigo Lar Bem Me Quer, de responsabilidade da Prefeitura de Cachoeira do Sul. A detenta acabou envolvida em outro caso de conflito dentro da casa prisional, de acordo com a direção do Presídio Estadual. Mas a versão é rebatida por mães de outras presas, segundo apurou a reportagem do Portal OCorreio. A história seria apenas uma fachada para viabilizar a transferência e quatro detentas. “A possibilidade de transferência é verdade. Quando da entrada daquela apenada que foi condenada por tortura no lar provisório, as outras presas a expulsaram da cela”, pontua o diretor. “Transferências pontuais são mecanismos que utilizamos bastante”, confirma o chefe de segurança da instituição prisional.

A versão não convence familiares das presas localizadas pelo OCorreio. “Querem ‘viajar’ minha filha e mais três injustamente. Disseram que não tinha prova. Tem gente que foi agredido lá dentro e não se fez nada. Foi tentativa de homicídio (caso do homem agredido na cabeça). Tá todo mundo revoltado. Estão fazendo uma injustiça”, enfatiza a mãe de uma detenta que cumpre pena no Presídio de Cachoeira do Sul.

Outra mãe que atendeu ao pedido da reportagem também duvida das agressões. “Não dão provas de que ela está machucada. Onde está o exame?”, pergunta. “Elas (as outras presas) falaram que não tocaram na mulher. Se ela não está machucada, como é que foi agressão?”, rebate outra mãe. “Não queremos que levem nossas filhas para longe. Aqui é melhor. A gente leva as coisas para elas. Longe, não. Não dá para ficar gastando dinheiro viajando assim”, acrescenta.

O possível destino das detentas seria a prisão em Lajeado, no Vale do Taquari, região que enfrenta problemas com a pandemia de Covid-19. A situação desperta ainda mais receio. “Não podemos ver nossas filhas. Se morrerem, não vão se importar. Não vai dar nada. Nada. Deviam colocar para perto de mim”, clama uma das mães, moradora de Santa Cruz do Sul.

Para a familiar de uma das presas, a estratégia adotada tem um objetivo: acabar com a presença de dentas no local. “Não querem mulheres no Presídio de Cachoeira. A gente não pode ver por causa do Coronavírus e podem tirar elas para uma cidade que ‘tá minada’ de Coronavírus?!”, suspeita. “Minha filha está em depressão”, lamenta uma das mães, durante conversa com a reportagem do portal.

Um amigo de parentes das detentas que podem ser transferidas concordou em conversar com a reportagem do Portal OC. “Tem o relato de tortura de uma apenada na cela feminina. Mas não aconteceu. E nós, como família carente, não temos acesso e nem muito o que fazer”, desabafa. “Ela (mulher presa por agressão contra um bebê) nunca foi agredida. Foi tudo algo pensado para ‘sortear’ algumas detentas e usar como ‘bode expiatório’. Estão tentando transferir quatro apenadas por algo que não ocorreu. A suposta vítima não tinha lesões e nem marca. Nem exames foram feitos”, ressalta.

Crédito: OC/Arquivo

Já a direção do Presídio Estadual de Cachoeira do Sul afirma que intenção é contornar problemas dentro do estabelecimento prisional. “A ideia é manter a disciplina. Não deixar que essas lideranças negativas interfiram e queiram escolher quem vai ou não entrar na cela”, acentua o diretor. “Foram registradas as agressões na Polícia Civil para responsabilizar esses apenados e apenadas”, reforça Martins. “Não é uma situação rotineira, mas tivemos uma piora de comportamento com a questão da pandemia”, avalia.

As informações apuradas pela reportagem do Portal OCorreio foram encaminhadas ao Ministério Público.

Sair da versão mobile