A personagem mais rebelde dos quadrinhos latino-americanos chega aos 60 anos ainda provocativa. Mafalda, do cartunista argentino Quino, tornou-se inspiração para novas gerações do seu país e do mundo. É como se a “criatura” tivesse ganhado vida própria, para além do seu “criador”, falecido em 2020.
As frases ácidas e veia crítica de Mafalda estimulam debates em salas de aula, escolas de arte e quadrinhos. Também é “presença” recorrente em camisetas e bandeiras de protestos políticos, especialmente quando o assunto é a própria Argentina.
Inspiração
A personagem de Quino também é referência para artistas e educadoras brasileiras. A quadrinista May Solimar aprendeu com Mafalda que é possível expressar em linguagem simples e lúdica as reflexões mais complexas.
May lembra da personagem quando produz quadrinhos que tratam do combate ao machismo e do racismo, assim como quando ilustra as vivências de mulheres pretas, mães solo. “A Mafalda é uma inspiração incrível. Um símbolo de ativismo. Ela atinge vários públicos e fala como todo mundo entende. Mostra a arte como forma de ligação das pessoas com lutas importante”, destaca May.
A professora e agente de turismo Taina Gonçalves também tem Mafalda como referência. Atualmente morando em Buenos Aires, ela trabalha como guia e orientadora, especialmente de brasileiros que vão estudar medicina na Argentina. “Mafalda é sempre atual com seus questionamentos. Como educadora uso as tirinhas para ensinar meus alunos para além do idioma. Ela me ajuda a incentivá-los como seres humanos”, conta Taina.
“Mafalda nunca envelhece. Em meio a crises e mudanças é fundamental que continuemos defendendo o direito de questionar, expressar nossas opiniões e buscar um mundo mais justo. Não devemos perder a capacidade de nos indignar”
– professora e agente de turismo Taina Gonçalves
Mafalda: uma voz Contra a opressão
A história de Mafalda é inseparável do contexto sociopolítico em que foi criada. Surgindo em 1964, em meio a um período turbulento na América Latina, incluindo o regime militar no Brasil, Mafalda se tornou uma crítica feroz e sutil aos regimes autoritários. Com seu discurso afiado e uma perspectiva crítica de esquerda, a personagem desafiava as normas estabelecidas e denunciava as injustiças do mundo adulto, tudo isso através dos olhos de uma criança.
As tiras de Mafalda foram publicadas em mais de 35 idiomas, e rapidamente se tornaram um fenômeno mundial. Porém, apesar de sua popularidade, Quino decidiu encerrar a produção das tiras em 1973, após nove anos de publicações. Essa decisão veio num momento em que a personagem estava sendo adaptada para uma série de desenhos animados, o que levou Quino a sentir que Mafalda estava se distanciando de sua natureza original, mais adulta e crítica.