Doutrinador: o herói (anti-herói?) brasileiro

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Doutrinador: o herói (anti-herói?) brasileiro
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24 de outubro de 2024 - Doutrinador / Crédito: Reprodução

O Doutrinador é um dos super-heróis mais emblemáticos do cenário brasileiro, conhecido por sua abordagem violenta e direta no combate à corrupção. Criado pelo quadrinista e ilustrador Luciano Cunha em 2013, o personagem rapidamente se destacou pela sua temática, que reflete questões muito presentes na realidade do Brasil, como a corrupção sistêmica, a impunidade e a falta de justiça. O Doutrinador é uma figura antissistema, um vigilante mascarado que opta por fazer justiça com as próprias mãos em um país onde, muitas vezes, as leis parecem beneficiar os criminosos.

Doutrinador / Crédito: Reprodução

Doutrinador / Crédito: Reprodução

Origem e história do Doutrinador

O alter ego do Doutrinador é Miguel, um ex-membro de uma força especial de elite do Brasil, treinado em combate e operações táticas. Ele é um personagem com um passado traumático que, após sofrer uma grande perda pessoal, decide ir além do sistema judicial ineficaz e corrompido. Miguel vê o país mergulhado em corrupção, com políticos, empresários e figuras de poder enriquecendo à custa do sofrimento da população. O sistema legal se revela incapaz de punir os verdadeiros culpados, e é aí que Miguel decide se transformar no Doutrinador, um vigilante com o objetivo de exterminar os corruptos.

Sua história é marcada pela dor de perder sua filha, morta em um contexto de negligência médica, e pela desilusão com o país. Sentindo-se impotente diante das leis que não protegem os cidadãos, Miguel assume a identidade de Doutrinador para buscar vingança e justiça. Armado com sua habilidade em combate, inteligência tática e um arsenal de armas, ele começa sua caçada aos corruptos.

O Doutrinador usa uma máscara de gás, símbolo de sua guerra contra os “venenos” da sociedade – os políticos corruptos e empresários inescrupulosos. Sua aparência é intimidante, com um traje todo preto, refletindo a seriedade e brutalidade de sua missão. Ele não hesita em matar seus alvos, algo que o distingue de muitos outros heróis, que geralmente têm um código moral que os impede de tirar vidas.

Doutrinador / Crédito: Reprodução

Doutrinador / Crédito: Reprodução

A luta contra a corrupção

O principal foco do Doutrinador é o combate à corrupção no Brasil. Ele acredita que as estruturas do poder são intrinsecamente corruptas e que só uma ação direta e violenta pode efetivamente mudar a situação. Para ele, o sistema judicial e as investigações políticas são incapazes de produzir resultados significativos, já que os próprios políticos e grandes empresários controlam as regras do jogo.

A história do Doutrinador é uma crítica à impunidade no Brasil. O país, segundo a narrativa, vive uma situação onde os crimes de colarinho branco, como desvios de verbas, lavagem de dinheiro e corrupção, são pouco ou nada punidos. Isso gera um ciclo de pobreza e violência que afeta principalmente os mais vulneráveis. O Doutrinador decide quebrar esse ciclo, não pela via política, mas por meio da violência. Ele personifica o desejo de justiça imediata que muitos brasileiros sentem ao verem repetidamente escândalos de corrupção sem consequências para os culpados.

Doutrinador / Crédito: Reprodução

Doutrinador / Crédito: Reprodução

O impacto do Doutrinador

Desde sua criação, o Doutrinador gerou muito debate no Brasil. Ele surgiu num momento de grande insatisfação política no país, quando protestos populares tomaram as ruas em 2013. O personagem é, de certa forma, um reflexo desse sentimento de revolta. Luciano Cunha, o criador do Doutrinador, afirmou que a ideia para o personagem veio justamente de sua própria indignação com a situação política do Brasil. Ele começou a publicar tirinhas online, que rapidamente ganharam notoriedade.

O sucesso do Doutrinador nas mídias digitais foi tanto que, em 2018, o personagem ganhou uma adaptação para o cinema, seguida por uma série de TV. O filme “O Doutrinador” foi dirigido por Gustavo Bonafé e traz o ator Kiko Pissolato no papel principal. A produção aborda a trajetória do vigilante e sua caçada aos políticos corruptos, mantendo o tom sombrio e violento dos quadrinhos. O filme foi bem recebido pelo público e destacou-se por ser uma das poucas produções brasileiras a abordar o tema de super-heróis de forma madura, ainda que o personagem seja mais um anti-herói.

Além do filme, uma série de TV foi lançada pelo canal Space, explorando ainda mais as motivações do personagem e sua luta contra o sistema. A série teve um bom retorno, consolidando o Doutrinador como um ícone da cultura pop brasileira.

Doutrinador / Crédito: Reprodução

Doutrinador / Crédito: Reprodução

Um anti-herói controverso

Apesar de seu sucesso, o Doutrinador também é uma figura controversa. Por um lado, ele é visto como uma representação do desejo de muitos brasileiros por justiça rápida e eficaz contra os poderosos. Por outro, ele levanta questões sobre os limites da justiça e até onde alguém pode ir para fazer o que acredita ser certo. O Doutrinador mata sem hesitar, age fora da lei e não responde a ninguém. Sua abordagem levanta discussões sobre o papel da violência na busca por justiça e se é possível combater a corrupção sem se tornar parte do problema.

Muitos críticos destacam que, embora o Doutrinador reflita a frustração com o sistema, sua violência excessiva e a falta de escrúpulos podem ser perigosos como exemplo. Ele é, afinal, um produto de uma sociedade cansada da ineficácia das instituições, mas sua solução – matar os corruptos – pode ser vista como extremista.

O Doutrinador é um herói brasileiro que canaliza a insatisfação popular com a corrupção e a impunidade no país. Ele é um personagem sombrio, que atua fora da lei e usa a violência como principal ferramenta para punir os poderosos que exploram a população. Sua história, embora ficcional, toca em pontos sensíveis da realidade brasileira, o que fez com que rapidamente se tornasse um ícone da cultura pop nacional.

A jornada de Miguel, o Doutrinador, é tanto uma reflexão sobre a corrupção no Brasil quanto uma exploração dos limites da justiça. Com sua máscara e métodos brutais, ele questiona a eficácia do sistema legal e propõe uma solução radical – ainda que controversa – para o problema. O sucesso do personagem em várias mídias mostra o quanto a figura de um vigilante antissistema ressoa com uma parte significativa da população.