A Polícia Civil segue apurando informações levantadas durante a Operação Alcateia, desencadeada nessa semana, que teve o objetivo de desarticular uma organização criminosa especializada em aplicar, particularmente em idosos, o “Golpe do Cartão de Crédito Clonado”. O esquema fez vítimas em Cachoeira do Sul, segundo a investigação. Um grupo vendia os dados aos golpistas para os ataques. A reportagem do Portal OCorreio localizou um negociador que revela o conteúdo do pacote. Ao acreditar que trata com o próximo golpista que seria seu cliente, o homem detalha:
O próprio negociador explica as consequências do uso dos dados que comercializa sem a autorização dos seus titulares:
Ao ser questionado sobre a credibilidade das informações vendidas, o homem sugere encaminhar amostras para confirmar que são reais:
Até mesmo orientações ao golpista que é cliente do esquema são indicadas, caso as vítimas façam perguntas:
A ideia é enganar os alvos do golpe com a falsa história:
A reportagem localiza o articulador de outro grupo que vende dados particulares de aposentados e pensionistas. Ao confirma que seu banco de informações contempla Cachoeira do Sul, o homem detalha:
Na sequência da negociação, ele revela a quantidade de cachoeirenses na sua lista com os dados que oferece. As vítimas sequer imaginam que suas informações são vendidas, apesar de nunca terem autorizado:
Para cada dez aposentados e pensionistas de Cachoeira do Sul na lista que vende, o negociador garante que oito correspondem com os dados reais:
A quantidade de alvos chama a atenção e serve de atrativo ao esquema que abastece golpistas:
A operação contabilizou 87 mandados judiciais, sendo 67 mandados de busca e apreensão e 20 mandados de prisão preventiva. Na ação, 16 pessoas foram presas, entre as quais dois líderes da organização. Foram apreendidos diversos objetos relativos aos golpes, inclusive duas centrais telefônicas.
O negociador encontrado pela reportagem do OC confessa saber que o esquema montado para a comercialização dos dados é ilegal:
Confiança. A palavra é valorizada pelo homem que trata da venda de informações de aposentados e pensionista também de Cachoeira do Sul:
A Operação Alcateia é resultado de investigações realizadas por duas delegacias da Polícia Civil Gaúcha: a Delegacia de Proteção ao Idoso e Combate à Intolerância de Santa Maria e a 1ª Delegacia de Polícia de Pelotas. O cumprimento dos mandados judiciais, no estado de São Paulo, foi executado com o auxílio da Polícia Civil de São Paulo. A ação foi batizada com o nome de Alcateia devido ao fato de os estelionatários iniciarem o contato com a vítima com a desculpa de que estão tentando ajudar, a sua atuação foi comparada à expressão “lobo em pele de cordeiro”.
A estratégia de enganar as vítimas utiliza de meios eletrônicos para reforçar uma falsa credibilidade ao golpe, conforme o delegado especializado no combate aos crimes cibernéticos, Emerson Wendt, descreve:
Estima-se que o valor de prejuízo às vítimas totalize mais de R$ 550 mil. Já foram identificadas 43 pessoas com participação direta e indireta nos crimes, incluindo os responsáveis pela busca dos cartões, “telefonistas”, instaladores da central com o sistema “URA” (Unidade de Resposta Audível) – equipamento para call center -, integrantes que conferiam as transferências bancárias e “laranjas”, que tinham seus nomes usados no esquema. “Apurou-se que os dados de 62 mil vítimas, quase todas idosas, foram vendidos para os criminosos. Dentre os dados há as seguintes informações: nome completo, data de nascimento, endereço completo, telefones fixo e celular, e-mail, escolaridade, profissão, aposentadoria (sim ou não), se a pessoa possui banda larga, renda, banco utilizado e agência bancária. Essa é a forma pela qual os criminosos conseguem dar credibilidade a sua conduta. Pois, assim, a vítima acredita que está falando com um representante da central ou do banco”, destaca a delegada Débora Dias, que atuou na operação.
Como agiam?
O golpe começava com a realização de uma ligação para a vítima, geralmente idosa. O criminoso dizia ser funcionário de uma central de monitoramento de cartões e solicita confirmação de supostas compras, na maioria das vezes, realizadas em outros estados. A vítima diz que não foram autorizadas as supostas compras. Em seguida, o golpista orienta a vítima a ligar para o seu banco, para o número existente no verso do cartão bancário. Então, a vítima, acreditando que foi alvo de uma clonagem de cartão, liga para o número verdadeiro da central bancária, mas os criminosos desviam a sua ligação por meio de uma central telefônica que tem instalado o sistema “URA” (equipamento para call center). O alvo do golpe passa a conversar com outro criminoso, que se identifica como funcionário de uma central de segurança do banco, afirma que o cartão da vítima foi clonado e que estão sendo feitas compras. Então, o falso funcionário segue dizendo que seria necessário realizar um procedimento de bloqueio do cartão e também uma “investigação de clonagem”.
A próxima orientação para as vítimas era inserir dados pelo teclado do telefone, incluindo a senha do cartão. Além disso, deveria cortar ao meio o seu cartão bancário, sem danificar o chip, escrever uma carta de contestação das supostas compras e autorizando uma “investigação junto ao banco e Polícia Civil ou Federal”. Em seguida, era solicitada a entrega do cartão cortado e da carta dentro de um envelope lacrado (com cola e grampos) em uma agência de outro estado, no mesmo dia. Quando a vítima diz que não tinha condições de cumprir a solicitação, o golpista garantia mandaria um representante até a casa da vítima para recolher o envelope com o cartão e a carta. Outro criminoso seguia até a casa da vítima e apanhava o seu cartão.
Com o material, o esquema possibilitava que os golpistas fizessem saques e compras via máquinas de cartão débito/crédito. O criminoso que seguia falando com a vítima solicitava que o seu aparelho celular fosse desligado por algumas horas, com a desculpa de que fossem feitas atualizações de segurança. O objetivo era impedir que a vítima fosse alertada pelo banco a respeito dos saques, compras e transferências efetuados pelos golpistas.
A quadrilha atuava no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Piauí, São Paulo, Espírito Santo e Rio de Janeiro. Além de Cachoeira do Sul, os golpes foram registrados em Santa Maria, Rio Pardo, Passo Fundo, Pelotas, Rio Grande, Erechim, Caxias do Sul e Soledade.